Então você liga a televisão, após um dia cansativo de trabalho, e metade do telejornal só fala de corrupção na política, desvios de milhões, bilhões de reais, dinheiro proveniente dos impostos que você e eu pagamos todos os dias.
É revoltante e desanimador, concordo. A nossa primeira reação é de nos afastar o máximo possível desse assunto, sobre o qual não podemos interferir de imediato. O máximo que podemos fazer como cidadãos é aguardar, pacientemente, a chegada de novas eleições para não votar nos envolvidos em escândalos.
Mas isso demora tanto que nem nos lembraremos quem eram os protagonistas, nem saberemos distinguir nos discursos e debates quem estará dizendo a verdade. Então, o que fazer?
Assim como se acompanha uma novela ou uma série na TV, em que os episódios vão passando e vamos conhecendo os personagens, seus rostos, nomes e características, também podemos acompanhar os fatos políticos.
Na ficção, de acordo com nossos valores éticos e morais, vamos nos afeiçoando a determinados personagens e identificando quem são os vilões e quem são as vítimas. Sabemos de antemão que o autor sempre dará um jeito de resgatar as vítimas injustiçadas, fazer com que elas vinguem seus algozes e tudo se desembocará num final feliz, com risos e muita emoção.
Na novela da vida real não há roteiro pré-determinado. Os fatos vão se desenrolando e a cada capítulo uma surpresa ou manobra pode ocorrer, mudando o curso da história em variadas graduações. Se acompanhamos os fatos políticos com atenção, de acordo com nossas convicções, vamos nos afeiçoando a uns e nos enfurecendo com outros, assim como ocorre na ficção.
A diferença fundamental entre a novela de ficção e a vida real é que, na ficção, seja qual for o desfecho do capítulo ou mesmo do episódio final, nada mudará em nossa vida. Desligaremos a televisão com a certeza de que no dia seguinte nossa vida continuará totalmente alheia aos fatos ocorridos na novela.
Já na vida real, uma conversa grampeada numa investigação e tornada pública pode balançar o mercado financeiro, quebrar empresas, aumentar o desemprego, a inflação e tornar o país mais instável, o que afeta de verdade o nosso salário, nossa segurança, nossa estabilidade emocional, nos deixa mais preocupados com o futuro e isso tudo nos rouba a paz.
Numa democracia, o povo não escreve o roteiro, mas tem responsabilidade primordial na escolha dos atores que vão atuar em seus papéis. Conhecendo portanto as características pessoais, morais, administrativas e políticas de cada ator, poderemos fazer melhores escolhas para a história a ser contada nos anos seguintes.
Os inúmeros casos de corrupção que temos visto atualmente são frutos de escolhas às cegas que fizemos no passado, em que demos legitimidade e responsabilidade a atores que só queriam engordar o seu próprio cachê, mesmo que isso representasse incorporar um vilão em pele de mocinho.
PorAdilson Baptista
Jornalista